A água que descia do lenheiro, era marrom.
Para nós, não tinha cor mais linda, e nem água mais milagrosa.
Chovia sempre em novembro, em dezembro, em janeiro, e as vezes até no carnaval.
E dia de chuva, era melhor que dia de coroação ou de procissão!
Ah...quantos barquinhos de papel a gente colocava na enxurrada.
Tenho pena de minhas filhas, que nunca colocaram barcos de papel em enxurrada!
Tinha aquela história, sinistra... do soldadinho de chumbo e da bailarina. Eu sempre ficava com lágrimas a escorrer quando lia, por que me lembrava dos barquinhos, e das enxurradas.
Pois não é que além dos barcos, a gente podia, quando dava uma 'estiada', correr pro cais, e ver o rio, enorme, cheio e marrom, quase alcançando a ponte de ferro, e bem pertinho dos nossos pés....
A agua passava forte, levando tudo, e os nossos pés balançavam e quase a gente ia... deliciosas chuvas que enchiam de água marron o Lenheiro!
Tá, todo mundo vai falar que viveu infância igual, que em todas as casas de avós era assim, mas...
Essa história é diferente.
Ela é a história da gente.
Por acaso voce já teve avô que quando não podia pagar o colégio para os filhos ia pro confessionário da igreja do colégio ( naquela época só existia o santo antonio) e falava:
- Padre, preciso me confessar.
- O que foi , Paulo, diga meu filho...? ( o padre conhecia todo mundo...)
E meu avô respondia :
- Vou pecar padre, vou roubar...
- Mas , paulo meu filho, não faça isso...voce sabe que é pecado... deus vai te dar forças..
- Não padre, eu preciso roubar, estou desesperado precisando de dinheiro, ...
- Mas , paulo por que, para que?
- Ah padre, quer mesmo saber?
- Claro meu filho, farei de tudo para impedir que voce cometa um pecado..
- Então vou contar...preciso de dinheiro para pagar o senhor, por que meus filhos precisam estudar e não estou podendo pagar o colégio há tres meses...
Esse era o meu avô... é claro que o padre liberou o débito, deu bolsa de estudo para dois, e ainda morreu de rir de como meu avô tinha "pegado" ele....
Voltando as águas que sempre descem lá do lenheiro e percorrem a cidade , e vão até o mar passando e molhando caminhos dos mais lindos, vou contar também, que no verão, muitas vezes o sheno, o zeca hallack, e a turma deles, pegava aqueles pneus enormes, de caminhão, e a gente descia o rio dentro das boias, e tem vez que já fomos até Tiradentes....
Mas...essa é uma história de Alvarenga!
Trecho de Carlos de Laet, em seu livro "Em Minas", quando se refere ao córrego do Lenheiro :
"Quem olha para o riacho, minguado em água, mal compreende porque tão elevadas se fizeram essas arcarias, porém mal raciocinaria quem condenasse por inútil a luxuosa cautela dos construtores. O ribeiro, por ocasião das enxurradas, faz-se torrente e mesmo rio. Em sua carreira vertiginosa arrebataria obstáculos que com menos resistência lhe afrontassem o ímpeto... Imagem verdadeira de um povo pacífico, cuja força mal se deixa suspeitar, mas contra quem, nos seus grandes momentos de cólera, todas as preocupações não podem ser demasiadas."
Layout / Art: Ana.
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