A RUA DA ZONA O curioso é que eles faziam fila para entrar na casa.
Era uma curiosidade enorme, e ninguem nos falava a verdade.
Eu sabia que "era mentira", a explicação vaga da minha avó, e a risadinha que acompanhava o rosto do meu pai quando perguntava por que as casas da rua de trás da igreja do Carmo ficavam fechadas durante o dia, só abrindo as janelas depois das três, quatro horas da tarde.
- Lá é a zona, diziam meus primos, e danavam a rir.
Como assim? que zona? que trem é esse?
E lá vinham outros deboches e gargalhadas masculinas...
As casas eram parecidas, tinha o mesmo telhadinho, janelas iguais, barroco sanjoanense.
Umas brancas, janelas azuis, outras rosas, janelas marrons.
As mais feias eram pintadas de verde.
Era proibido passar lá, mas como não ir?
Ficava perto da rodoviária, atrás da igreja do Carmo, e perto da padaria e dos biscoitos mazzoni.
Ah, como os homens sempre foram privilegiados, eu pensava.
Podiam ir pra zona, lugar bonito, iluminado a noite, cheio de música e colorido.
Eles sempre iam arrumadíssimos, e ficavam na fila em frente algumas casas.
Eram as especiais, soube depois.
Naquelas casas "de fila", ficavam as moças mais novas e recém - chegadas na cidade .
Novidade.
As prostitutas mais novas.
Meninas quase, eu vi.
Eram festejadas, adoradas e presenteadas.
Vez por outra corria o boato na cidade de que algum filho de família havia se apaixonado por uma delas...
Problema burguês, solucionado com mentiras e com o escondido, como sempre.
E o pobre coitado do rapaz ia direto para o Rio de Janeiro.....
As prostitutas que moravam na zona de São João Del Rey tinham um horário de missa só para elas. Quem marcou, eu não sei, mas que é verdade eu sei...
No carnaval, era a rua mais cheia, dia e noite, e d'onde ouvia escondido na esquina, com minhas primas, as maiores risadas...
Era de lá, da zona, que os meninos voltavam mais felizes e risonhos.
Como eles gostavam de ir pra lá!
As prostitutas sempre fizeram os homens felizes.
Devem ser grandes mulheres.
by Idy - carnaval de 1977 -SJDR( adaptado)